Para ir da cidade capixaba de Vitória até a histórica Ouro Preto (MG) são 451 quilômetros, que podem ser percorridos em torno de seis horas e meia contando com tempo bom e condições normais das estradas. Mas, que tal ir entre os mesmos dois pontos por um caminho de 820 quilômetros pela Rota Imperial durante quatro dias? Junte a isso uma moto e um roteiro composto quase que completamente por trilhas off-road e o que você tem o desafio aceito pelas mineiras Sabrina Katana, 30, Laura Nunes, 20 e Nilda Borges, 38, as únicas mulheres entre cerca de 400 pilotos que participaram da 31ª edição do Enduro da Independência.
Na partida para o primeiro dia de trilha, composto por 217 quilômetros que separam Vitória de Venda Nova do Imigrante (ES), ajustes de última hora eram feitos nas motos e equipamentos como o GPS checados. Principalmente para Nilda, a estreante do grupo, a ansiedade era grande. “Eu fico um pouco ansiosa por ser o meu primeiro Enduro”, conta. Laura – ou “Laurinha” como está escrito no tanque, nas bengalas e na balança de sua Honda CRF 230F já está em sua segunda participação na prova.
Já Sabrina é a veterana da trupe. Participante do Independência desde 2006, a mineira de Belo Horizonte desfilava o seu sorriso e mostrava tranquilidade antes da aventura começar. “Vai ser comprida, mas vamos lá”, dizia a moça. Maridos e pais também eram lembrados como fonte de apoio e inspiração pelas mulheres que resolveram trocar o salto alto pela bota off-road durante esses quatro dias. “Meu esposo me apoia bastante”, comentou Nilda. “Meu pai conferia as provas e sempre esteve nesse meio. Aí não tem jeito, é hereditário”, revelou Laura que também é estudante de Educação Física.
Uma baixa no caminho
A chegada do primeiro dia foi marcada por frio, chuva e polenta. Com população acima dos 20 mil habitantes, Venda Nova do Imigrante é conhecida em todo o Espírito Santo por conservar as tradições dos imigrantes italianos que colonizaram o município, inclusive o hábito de preparar polenta em um imenso caldeirão localizado no centro da cidade.
Infelizmente, ao chegar ao destino, descobrimos que nossas aventureiras sofreram uma baixa. Problemas em sua Yamaha TTR 230 fizeram com que Nilda Borges abandonasse a prova. “Eu tive que parar. Minha moto quebrou. Teve um problema no motor e começou a vazar óleo. Ficou para o ano que vem”, disse ela.
No dia seguinte, o “passeio” recomeça e os 204 quilômetros até Manhuaçu (MG) foram com tempo úmido e as belezas do caminho acabaram ocultas na neblina. Já em terras mineiras, o mal tempo deu uma trégua no terceiro dia de Enduro. Assim, os 231 quilômetros de trilhas que levavam até a penúltima parada do enduro, em Viçosa e os outros 168 quilômetros finais até Ouro Preto foram percorridos sob sol forte e muito calor.
Tocada diferente
Enquanto acompanhávamos as meninas pelas trilhas, era possível notar a diferença entre o estilo de pilotagem delas com a de outros competidores que participavam do Enduro. Enquanto a maioria dos homens se movia mais rápido e confiava na força física para tirar as motos dos buracos que iam aparecendo pelo caminho, elas optavam por uma receita mais simples: não cair neles. “Eu ouço muito das pessoas que me veem pilotar, que eu faço parecer fácil”, brinca Sabrina, completando que gosta da sua moto e evita deixa-la cair pelo caminho.
A técnica também era o ponto forte de Laura, que em muitos trechos deixava de lado a velocidade para completar uma passagem com precisão. E sem perder a atenção na planilha que a guiava. Já a chegada das meninas a Ouro Preto aconteceu no “Dia da Independência” e o clima de satisfação estava no ar. “Quase errei em alguns lugares, mas acabei indo bem e melhor do que nos outros dias”, disse Laura Nunes. A mineira também revelou que costuma andar junto com o namorado pelas trilhas. “Todo mundo chama ele de “rôia” – termo mineiro para quem é travado na trilha –, mas ele não fica bravo não”, brincou.
O brilho do dever cumprido também estava nos olhos de Sabrina Katana. “A gente que é mulher sabe que não é fácil. Mas ainda assim eu andei na frente de muitos homens”, contou a moça orgulhosa que acelerou também uma Honda CRF 230F. Sobre a companheira de trilha que havia acabado de completar seu segundo Enduro da Independência, Sabrina não poupou elogios. “A Laurinha é o futuro. Veio acelerando direitinho”. E esperamos que seja mesmo. Não apenas ela, mas outras que virão para confirmar que batom e motociclismo off-road têm tudo a ver.