O Motocross no Brasil ainda está longe de ser comparado com os principais campeonatos estrangeiros, como o AMA Motocross, nos Estados Unidos, e o Mundial de MX1 e MX2, que percorre diversos países. Porém, é notável a evolução do esporte no País. O campeonato nacional, por exemplo, tem oito etapas, percorrendo estados do sul, sudeste, nordeste e centro-oeste. Sempre atraem muitos pilotos e equipes e a atenção da mídia. Sem falar na presença do público, que sempre lota as arquibancadas.
Nos últimos anos, o motocross brasileiro tem atraído, inclusive, pilotos estrangeiros para as provas. Mas tudo isso começou lá atrás nos anos 1970 e 1980, quando pilotos veteranos, que iniciaram a prática do off-road no Brasil, superavam a falta de motocicletas e equipamentos de segurança por amor ao esporte em duas rodas.
A década mais importante para a evolução do esporte nacional foi a de 1980, quando as grandes marcas de cigarro e cerveja começaram a patrocinar as competições. Os anos 80 também marcaram a chegada dos primeiros pilotos estrangeiros ao país, que revolucionaram a maneira como o esporte era visto e praticado. Para entender mais sobre isso, conversamos com gerações diferentes, pilotos que começaram nos anos 80 e ainda estão na ativa, e as jovens promessas do esporte nacional.
Para começar
A maioria dos pilotos veteranos de motocross iniciou sua vida esportiva em duas rodas mas sem motor, ou seja, nas bicicletas. Antes de começar no motocross, os primeiros passos foram dados na bicicross, ensaiando os saltos nas pistas de terra, muitas vezes feitas por eles mesmos.
“Era outra época. Sou do tempo de Roberto Boetcher, Paraguaio, Moronguinho, etc, e minha influência veio da bicicleta. Minha primeira corrida de motocross foi em 1982, numa prova promocional, em Bragança Paulista, minha cidade natal. Pedi uma moto emprestada, mas, escondido de meus pais, porque tinha apenas 14 anos e naquele tempo não podia correr com essa idade. Diferente de hoje, um piloto dessa idade era considerado muito jovem. Por ter mais categorias de base, atualmente é muito mais fácil entrar no mundo do Motocross”, disse Jorge Negretti, hoje com 45 anos, e ainda fazendo shows de motocross freestyle.
Já Thales Vilardi, piloto da equipe oficial Honda de Motocross, hoje com 22 anos, começou nas pistas aos quatro com uma motocicleta de 50cc de seu pai. Conseguir patrocínios sempre foi difícil, mas com talento e um pouco de sorte, o rapaz conquistou grandes apoiadores logo de cara. “Meu primeiro grande parceiro foi meu pai. Fiquei uns bons anos sendo ‘paitrocinado’. Mas, com alguns bons resultados no começo da carreira, consegui uma maior visualização e hoje atingi o nível profissional”, disse o jovem paulista.
Freio a disco era luxo
Também nos anos 80, começaram a chegar as primeiras motos off-road profissionais. As máquinas de competição eram equipadas com motores dois tempos e fabricadas com materiais mais pesados, mas ainda assim eram melhores que as Yamaha DT e Honda XL que eram motos de uso misto adaptadas para as pistas. “Mesmo tendo uma grande diferença para as motocicletas de atualmente, naquele tempo ficamos impressionados quando desembarcou por aqui a primeira moto equipada com freio dianteiro a disco original de fábrica, em 1984. Mas, assim como hoje, era grande a dificuldade para adquirir um modelo novo. Poucas marcas traziam motocicletas off-road oficialmente e não havia muitas importadoras de veículos. Tinha que ser na raça e na coragem para entrar no esporte”, relembra Negretti.
Hoje é diferente. Honda, Kawasaki e Yamaha já importam modelos off-road para iniciantes. Porém como são importadas, o jovem piloto precisa desembolsar, no mínimo, R$ 7.000,00 para adquirir uma motocicleta própria para o uso off-road. Essa é a principal diferença entre os pilotos nacionais e os estrangeiros. Lá fora, a primeira motocicleta pode ser facilmente comprada por U$ 1.000,00, uma diferença exorbitante.
Fora isso, peças e acessórios são mais acessíveis no exterior. “É difícil ver que lá fora, as motocicletas especiais (como são chamadas as motos off-road prontas para a pista) tem um preço que é menos da metade dos praticados no Brasil. Isso dificulta muito o progresso e evolução dos pilotos nacionais, principalmente nas categorias de base”, disse Thales Vilardi, piloto da Honda.
Equipamentos
Os equipamentos de segurança mudaram muito. Ficaram mais leves, confortáveis e mais seguros. “Para se ter uma idéia, eu tive meu primeiro capacete personalizado de motocross somente em 1989. Eu ainda o guardo. Colocando o antigo lado a lado com os novos cascos, vemos nitidamente a diferença entre um e outro. O novo é maior, com mais espuma interior e um material mais leve e de maior resistência a impactos”, conta Negretti.
Além disso, os equipamentos não ofereciam a mesma proteção e eram muito mais pesados. “Todos os equipamentos chegavam a aumentar em 15 kg o peso total do piloto. Uma bota, por exemplo, chegava a pesar quase 10 kg. Hoje, os modelos top de linha pesam no máximo 5 kg, e são construídos com materiais mais flexíveis, aumentando o conforto”, continuou.
Protetores de pescoço, joelheiras articuladas, protetores de coluna e capacetes com tecnologias de ponta ajudaram a aumentar o nível de pilotagem do motocross. Os pilotos se sentem mais protegidos e seguros ao andarem no limite.
Treinamento
Muitos dos pilotos de antigamente flertavam com o estereótipo do rebelde aventureiro que se arriscava nas pistas de motocross. Hoje para ser competitivo é necessária toda uma estrutura voltada para o treinamento do piloto, muito mais um atleta de ponta do que um “louco” ao guidão de uma moto. Nutricionistas, ortopedistas, personal trainers e, especialmente, uma boa pista e uma ótima preparação da máquina são fundamentais para se sair bem no esporte.
“O treinamento é uma dos fatores mais importantes para uma boa evolução. Comecei a melhorar bastante depois que tive um acompanhamento nutricional e físico, com suplementos e exercícios especiais. Eu perdia muito rendimento durante as provas e com a estrutura certa, a evolução acontece naturalmente. Para ser um piloto de ponta, o atleta tem que ter dedicação, mas, acima de tudo, uma ótima preparação da máquina e um bom centro de treinamento para se dedicar à parte física e técnica quase em tempo integral”, explicou Vilardi.
Para Negretti, que esteve presente na etapa Brasileira do Mundial de Motocross MX1 e MX2 em Penha (SC), a participação dos pilotos brasileiros, mesmo como convidados, é de grande importância para o esporte nacional. “O nível de treinamento dos estrangeiros é outro, muito mais evoluído. Quando se tem a oportunidade de andar numa pista de nível mundial com pilotos excepcionais, sempre se aprende alguma coisa nova”, diz ele.
“Temos muito a agradecer à ‘velha guarda’. Além de ídolos, pessoas como Jorge Negretti ajudaram no crescimento do esporte nacional, atraindo cada vez mais público, patrocinadores e mídia para os eventos off-road. Devemos muito aos precursores do Motocross no Brasil. Não estaríamos aqui sem eles”, completou Thales Vilardi.
Merecida homenagem
Para homenagear os pilotos do Motocross brasileiro que ajudaram a construir a história do esporte no país, a organizadora do Honda GP Brasil de Motocross, Romagnolli Eventos, organizou a Corrida dos Campeões. A prova-exibição aconteceu durante a etapa brasileira do campeonato mundial, nos dias 18 e 19 de maio, na cidade de Penha (SC). Nomes como Pedro Bernardo Raimundo, - "Moronguinho", Jorge Negretti, Milton Becker - o “Chumbinho”, Elton Becker, Rafael Ramos, Roberto Boettcher, Rogério Nogueira, Nuno Narezzi, Wellington Valadares, Bernardo “Bê” Magalhães, Cristiano Lopes, Roque Colmann, participaram da celebração.
“O Brasil precisa valorizar mais seus ídolos. Falo isto não apenas em relação ao motocross, mas em todas as modalidades. Temos uma história rica, com esportistas importantes. Nada mais justo do que homenageá-los no principal palco do motocross mundial”, coloca Carlos Romagnolli, presidente Romagnolli eventos, organizadora da etapa brasileira do Mundial de Motocross.