Pais e mães, normalmente, ficam aflitos e até coíbem seus filhos de pilotar uma motocicleta. No entanto, esse instinto não é tão evidente quando os próprios pais são apaixonados pelas duas rodas. Seja no esporte ou por hobby, para alguns a motocicleta é um quase um ente da família. Presente nos passeios, nos encontros e até mesmo nas pistas, a moto sempre aparece na foto que ajudará a contar a histórias de suas vidas.
Alguns já “nascem” sobre uma motocicleta, enquanto outros precisam quebrar paradigmas para ganhar a primeira “magrela”. Na infância, no esporte, na vida e, principalmente na relação entre pai e filhos, a motocicleta ajuda a estreitar relações.
Na infância
Quem gosta de motos e vive o motociclismo sabe que muitas crianças praticamente nascem sobre a motocicleta. Esse é o caso de Luca Pardini Fernandes, 7 anos. Filho de Raul Fernandes Junior, 43, Luca dificilmente ficaria longe das duas rodas. Seu pai, formado em Administração de Empresas e Direito, atuou por 11 anos como editor da Revista Motociclismo e instrutor de pilotagem off-road – e hoje é diretor executivo da BMW Power Motorrad, concessionária da marca alemã em Santo André, ABC paulista.
E acreditem, mesmo com um pai com um currículo destes o motociclismo fica em segundo plano na vida do pequeno Luca, logo depois de sua maior paixão. “Ele adora jogar futebol e leva muito jeito para isto. Gosta de ir aos jogos no estádio e também assistir na TV”, revela Raul. Mas com o motociclismo inveterado nas veias do paizão, andar de moto é a segunda preferência de Luca. “Tudo começou quando ele aprendeu a andar de bicicleta sem rodinhas. Isso foi cedo, com apenas 3 anos e meio. Com 4 pedi uma Yamaha PW 50 emprestada e ele já começou a acelerar”, completa Raul, alertando para o fato do Luca pilotar muito bem no fora de estrada na fazenda da família que fica na região de Sorocaba, interior de São Paulo.
Com o futebol e a motocicleta como principais hobbies, Raul e Luca só esperam o próximo final de semana para se divertirem juntos, afinal, Luca ainda tem muita trilha pela frente. “Depois que ele começa a andar, não quer mais parar. Ainda mais depois que começou a me acompanhar pelas trilhas”, encerra o papai Raul, ansioso por mais um final de semana junto com o filho Luca.
No esporte
Quando o dom aparece em um filho o pai provavelmente será o primeiro a notar. Foi o que aconteceu com Eduardo Paiuta, 46, e sua filha Sabrina. Hoje com 17 anos, Sabrina ainda não tem habilitação para sair de moto na rua e está cursando o ensino médio, mas já acelera forte nas pistas do País. O grande “culpado” é seu pai, que desde os 13 anos trabalha em lojas de moto e é apaixonado pelas competições, seja de motovelocidade ou off-road.
Mesmo assim, não foi fácil para Sabrina ganhar o primeiro modelo. Os pais tinham certo receio em dar uma moto para sua filha pilotar. Mas de tanto insistir, conseguiu. “Depois de ela chorar muito lhe dei uma moto em 2002”, conta Eduardo. E hoje em dia, com a filha pilotando para a equipe oficial da Kawasaki, o pai continua trabalhando como comerciante para manter vivo o sonho de Sabrina, o tal “paitrocínio”. “Ainda não conseguimos nos manter só das competições, mas trabalhamos para isso”, explica a jovem promessa da motovelocidade brasileira.
Ainda na dúvida em qual profissão seguir na vida, Sabrina garante querer ser uma pilota de renome, mas já reconhece todo esforço do pai. “Trabalhamos juntos há 10 anos e em todo esse tempo ele foi meu treinador, psicólogo, chefe de equipe, mecânico”. E com toda a dificuldade ainda encontrada no motociclismo de competição do Brasil e os anseios de realizações maiores, Sabrina prefere encerrar o bate papo com mais uma homenagem. “Não somos apenas pai e filha, mas também grandes amigos. Como digo sempre a ele: sem você não sou ninguém”, conta a piloto, rasgando elogios ao pai.
Na vida
Erika Cunha, advogada de 27 anos, e Pedro Paulo da Cunha, empresário de 54 anos, moram em Teixeira de Freitas (BA). A vida deles sempre foi envolvida pelas motocicletas. Desde muito pequeno Pedro trabalha com motos, começando como ajudante de mecânico em 1970. Já em 1976 conseguiu abrir sua própria oficina, que mais tarde passaria a comercializar motos também. Atualmente a família tem uma concessionária Yamaha, além de fazer apresentações no Globo da Morte, com a equipe familiar batizada de Ekipe Cunha.
Pedro apresenta o show, onde seu filho e neto se apresentam. Erika não faz parte desta loucura, mas também não fica atrás. Anda de moto desde os seis anos e hoje “toca” uma superesportiva Yamaha YZF R6, de 600cc, na categoria SuperSport do Campeonato Superbike Series e ainda tem uma YZF R1 de 1.000cc para passear. Aliás, a temporada de competições deixou a filha mais longe do pai, já que agora a dedicação nas pistas é grande. “Já fizemos muitas viagens juntos, mas ultimamente por ela estar se dedicando as corridas, não tem tido tempo para viajar de moto”, explica Pedro.
De qualquer forma as duas rodas regem a vida da família Cunha e Erika não pensa duas vezes antes de dizer que “não abro mão de ter a moto a disposição, mesmo que seja ao menos para ir à padaria”. Cheia de gás, Erika parece não se cansar quando o assunto é motocicleta, diferente do seu pai, já mais sossegado. “Fiz parte dos Abutre´s MC e já percorri grande parte do Brasil sobre duas rodas”, conta, já realizado, Pedro Paulo.
Na relação
Raoul Cardinali Junior e Luiz Philipe Ferreira Cardinali não têm uma relação desde a infância com as motocicletas, mas mostram outro lado das duas rodas. Pai e filho, respectivamente, começaram de formas distintas, mas encontraram nas duas rodas um elo de cumplicidade. Com 16 anos Raoul já havia ganhado uma Yamaha AS1 do seu pai e depois disso não parou de colecionar modelos. “Em 1983 comprei minha primeira moto zero quilômetro: uma Honda CB 400”, conta com orgulho. Já Luiz teve mais dificuldades e conseguiu comprar sua Bandit apenas com a ajuda de Raoul, há dois anos. “Financiamento de pai, sabe? Paga em quantas vezes puder no tempo que der”, resume.
No entanto, a relação de pai e filho neste caso deve mais a motocicleta do que o contrário. Quando Luiz ainda era bem pequeno, na década de 1990, Raoul se separou da mãe de Luiz e uma nova fase começou para os dois. Sem falar com a ex-mulher, Raoul via o filho somente nos finais de semana que eram estabelecidos pelo acordo e não sabia exatamente que programa fazer juntos. “Nunca fui de ir ao parquinho ou coisas assim. Então pegava ele e ia passear de moto”, conta Raoul.
Anos se passaram, Luiz cresceu e hoje os dois se encontram e têm amigos em comum que compartilham da mesma paixão: andar sobre duas rodas. “Chegamos a ficar uns anos distantes, mas o interesse por motos com certeza nos deixou mais próximos”, lembra Luiz. Sem parecer piegas, pai e filho confidenciaram o que poucos dizem com clareza. Criar um hobby para unir a relação paternal é fundamental e se for de moto, melhor ainda. “Quando era pequeno morria de orgulho”, revela Luiz, lembrando que quando criança ficava encantado em ver o pai todo equipado sobre duas rodas. “Tinha o pai herói e o pai piloto. O meu era o piloto”, completa.