Na parede de seu escritório, Philipp Habsburg ostenta um grande pôster onde aparece a KTM Duke II rodeada por funcionários da fábrica. Entre os diversos modelos que viu se transformar de rabiscos na prancheta em modelos fabricados em série, a supermoto de 625cc é a preferida do engenheiro que hoje comanda o departamento de pesquisa e desenvolvimento da fábrica austríaca.
Há 13 anos trabalhando na KTM, Phillip já não traz a cabeleira da época em que participou da criação da Duke II. Mas coleciona muitos projetos de sucesso no currículo. À frente de uma equipe de 240 funcionários, entre designers, projetistas, mecânicos e operários, o engenheiro de 36 anos chefia um dos prédios mais secretos da sede da KTM, na pequena cidade de Mattighofen, noroeste da Áustria.
Além da área de Entwicklung, nome em alemão para o departamento de Pesquisa e Desenvolvimento, a pequena cidade austríaca abriga a administração, o marketing, o centro de distribuição de peças, a fábrica de suspensões WP, e a linha de montagem de todos os modelos da KTM. São prédios de design sóbrio nas cores laranja e preto, marcas registradas da fábrica austríaca.
Para se ter uma idéia da importância da empresa, Mattighofen tem uma população de cerca de 10.000 habitantes, dos quais 1.200 trabalham na KTM. “Nasci e me criei aqui. Para mim, trabalhar na KTM chefiando a área de pesquisa e desenvolvimento é a realização de um sonho”, diz o engenheiro Philipp, também motociclista.
Motocicleta no sangue
“A grande maioria dos trabalhadores são motociclistas. Não fosse a temperatura baixa e a neve que não para de cair, o estacionamento estaria cheio de motos”, faz questão de frisar Philipp que, assim como a grande maioria dos funcionários com quem conversei, nutre uma paixão pelas duas rodas.
O processo de criação de um novo modelo – ou aperfeiçoamento de um modelo de linha – passa em geral por três fases, explica Philipp. Tudo começa na prancheta, onde os projetistas fazem um rascunho de como será a moto. Os engenheiros então projetam cada peça individualmente. Basta cruzar uma porta para que uma equipe de funcionários transforme as idéias e arquivos de computador em realidade, ou seja, em um protótipo.
Na segunda fase, são feitos melhorias no projeto e aperfeiçoamentos nos componentes. Até que finalmente, o protótipo ganha as ruas para ser testado, encerrando o processo. “Todos que trabalham comigo andam de moto. Muitos protótipos que viram modelos de série são testados por nossos funcionários, no uso diário, além é claro dos pilotos de testes”, explica o engenheiro.
Da primeira fase até o lançamento, a pesquisa e o desenvolvimento de uma nova motocicleta leva em torno de 34 meses, ou quase três anos, estima o chefe do departamento, Philipp Habsburg.
Linha de montagem
Outro exemplo da ligação passional entre os funcionários e a KTM é Martin Schaumlöffel, responsável pelos vídeos e fotos de divulgação das motos KTM. Alemão de origem, Martin foi o guia durante a visita à linha de montagem. “Trabalhei na KTM há alguns anos. Voltei para a Alemanha para outra marca de motos, mas agora retornei para Mattighofen. Em outras fábricas, as motocicletas são um negócio. Aqui na KTM é paixão”, afirma enquanto explica o processo de montagem.
São quatro linhas de montagem aptas a montar todos os modelos KTM e também Husaberg, marca sueca adquirida há alguns anos pela empresa. “Nossa linha de montagem não é contínua como em outras fábricas. Em cada um dos 19 passos, os funcionários têm o tempo necessário para realizar o processo, sem pressa. Existe apenas uma meta diária que tem de ser cumprida. Com isso valorizamos a qualidade”, detalha Martin.
O cuidado na montagem impressiona. Desde a colocação manual dos parafusos (que depois são apertados com uma parafusadeira elétrica) até a senhora de idade que cola os adesivos, todos os processos são realizados com muito esmero. Cada motocicleta KTM leva em torno de 45 minutos para ser montada e testada – até ficar pronta para ser embalada.
Expansão
Apesar do crescimento dos últimos anos e da expansão mundial da marca, que deve inaugurar uma linha de montagem em Manaus (AM) no segundo semestre, a KTM não produz motos em massa. As vendas em 2008, melhor ano da empresa, foram de 96.000 unidades. Em 2009, atingida pela crise financeira, a KTM venceu somente 65.000 unidades em todo o mundo. Em 2010, o resultado final ainda não havia sido concluído em janeiro, quando visitamos a fábrica, mas a previsão era ficar em torno de 80.000 unidades.
Números que, se comparados às grandes fábricas japonesas, são irrisórios. Mas que colocam a KTM entre os três maiores fabricantes de motos da Europa. “Apesar de nosso tamanho, temos produtos competitivos para brigar de frente com as marcas tradicionais”, declarou o CEO da KTM, Stefan Pierer.
Ocupando o cargo desde 1993, Pierer, juntamente com um grupo de investidores, liderou o renascimento da KTM depois da falência em 1992. A reestruturação passou pela escolha do laranja como identidade visual da KTM – “toda marca de moto tinha sua cor. Escolhemos a cor laranja, por ser inédita e também por ser facilmente reconhecida” – até pela ampliação do leque de modelos da empresa – “em 2000, a KTM decidiu entrar para valer no segmento on-road”, explica o CEO, dizendo que a marca tem conquistado excelentes resultados nas provas de motocross e também rali.
Pierer fala com empolgação da chegada da KTM ao Brasil. “O Brasil é um dos países do BRIC (sigla criada pelos economistas para descrever os países emergentes: Brasil, Rússia, Índia e China) e o maior mercado da América Latina. Com o lançamento dos modelos de menor capacidade, temos um line-up para atender diversos perfis de consumidores em um mercado emergente como seu País”, conclui.
Além de inaugurar uma loja conceito na Avenida dos Bandeirantes em São Paulo (SP) e ampliar o número de distribuidores no País juntamente com o Grupo Izzo, a KTM vai montar as motos “laranjas” no Brasil.
Segundo Harald Plöckinger, Chief Operating Officer (COO) da KTM e um dos responsáveis pela implantação da linha de montagem em Manaus (AM), o local já foi escolhido. “Já temos um terreno praticamente acordado. Devemos começar a construção em abril e a previsão é de que no terceiro trimestre, a linha de montagem já esteja operando”, prevê o COO. A fábrica deve empregar entre 50 e 75 funcionários e deve ter capacidade produtiva de 15.000 unidades/ano inicialmente, mas o objetivo é chegar a 30.000 unidades em cinco anos.
As motocicletas serão montadas pelo processo CKD (Completely Knocked-Down). Estão nos planos da empresa montar desde a pequena Duke 200cc (projetada especificamente para o Brasil) até as motocicletas de maior capacidade cúbica, como a Enduro LC4 de 690cc e a Adventure 990. “Nosso objetivo é que as motocicletas KTM montadas no Brasil tenham a mesma qualidade que as saídas da linha de montagem aqui em Mattighofen. Essa é a minha função”, garantiu Harald.