Nos últimos anos, enquanto o mercado brasileiro de caminhões despencou, a Scania conseguiu manter algum nível de estabilidade para aquele momento. Não fez demissões em massa - segue com 3,2 mil funcionários na fábrica de São Bernardo do Campo, número pouco menor do que o de momentos de pico das vendas. Enquanto há montadoras de veículos comerciais que com quase 80% de ociosidade da capacidade produtiva, a companhia encerrou o ano passado com 45% de ocupação na unidade, que tem potencial para fazer 30 mil caminhões por ano.
A musculatura para atravessar a crise foi desenvolvida nos 60 anos de história da empresa no Brasil, a se completarem em julho próximo, e 55 anos do complexo produtivo do ABC Paulista. Ali já foram feitos 340 mil caminhões e 70 mil ônibus, com boa parte deste volume destinado às exportações.
Recentemente, no lugar de rever a estratégia e tentar uma abordagem diferente para superar a crise, a companhia apostou em melhorar o que já era a sua especialidade: vender caminhões customizados, produzidos por demanda e na medida para os clientes. “Trabalhamos de forma consistente e progressiva. Não brigamos por preço. Entregamos solução”, resume Roberto Barral, diretor geral da companhia no Brasil.
Em 2015 essa postura custou participação de mercado para a marca, que perdeu espaço em um cenário em que concorrentes reduziram os preços para conseguir desovar estoques. Agora, no entanto, a Scania começa a ser recompensada pela estratégia consistente. O mercado total de caminhões ficou 29% menor no primeiro trimestre do ano e, neste contexto, a montadora ganhou 5 pontos de participação nas vendas e respondeu por 18,2% do total emplacado nos segmentos acima de 16 toneladas.
“Conquistamos cinco pontos de market share e, no primeiro trimestre, ficamos acima da nossa meta para o ano, que é de 15%”, conta Victor Carvalho, diretor de vendas de caminhões da companhia. O resultado do ano passado também foi positivo. Foram negociados 1,2 mil caminhões, número menor do que o do ano anterior, mas que garantiu aumento de 0,6 ponto porcentual na participação de mercado da companhia, que chegou a 7,3% incluindo todos os segmentos de caminhões.
Foco nos pequenos transportadores e nas exportações
Para chegar ao resultado positivo a Scania ampliou o horizonte e foi buscar negócios nos pequenos e médios transportadores, que compram um veículo por vez e frequentemente enfrentam dificuldade para ter acesso a linhas de crédito. “Fizemos um trabalho com a rede de concessionárias para desenvolver uma abordagem individualizada desse cliente, que compra com uma frequência bem menor. Assim conseguimos entender a necessidade dele e tornar estes negócios viáveis. Atraímos um novo público”, conta.
Em paralelo, o Banco Scania aumentou sua disposição para liberar crédito. Em 2016 a participação da instituição nas vendas subiu de 17% para 40%. No primeiro trimestre deste ano o número seguiu aumentando para perto de 50%. “Em momento de crise, o banco da montando precisa ter participação mais efetiva”, avalia Carvalho. Segundo ele, a ofensiva para chegar aos clientes menores segue rendendo frutos e a expectativas é de que as vendas ganhem ainda reforço este ano com o aumento da demanda dos grandes frotistas.
“Eles vão precisar renovar a frota. Os financiamentos contratados no passado já venceram e rodar com caminhão antigo fica muito caro”, diz. O executivo reforça que, como os estoques das empresas concorrentes baixaram, o mercado começa a ficar mais favorável, com a prática de preços saudáveis pela concorrência e, portanto, mais espaço para a Scania atuar de acordo com a sua estratégia.
Com este cenário, a meta para o ano é ousada: crescer de 10% a 15% na comparação com o ano passado. O incremento de dois dígitos é superior ao esperado pela maior parte das empresas e entidades ligadas ao setor de caminhões. Ainda assim, a companhia lembra que a base de comparação é fraca. Em número de caminhões seria um incremento pequeno, aponta
Exportações e investimentos
Para garantir nível melhor de atividade na fábrica, além do esperado aumento no volume de vendas, a companhia incrementa também as exportações. A planta de São Bernardo do Campo é completa: produz chassis, eixos, motores e transmissões. No ano passado foram feitas ali 14 mil unidades, com 70% deste volume destinado às exportações. No passado, em momentos de demanda doméstica aquecida, a parcela exportada não chegava a 25%, segundo a empresa.
“Trabalhamos com sistema global de produção. Como a Europa começou a produzir a linha nova de caminhões, que ainda não tem previsão para chegar ao Brasil, nossa fábrica ganhou relevância como centro produtivo para abastecer os mercados que ainda são atendidos pela família antiga”, conta Carvalho. Entre os principais clientes estão países da Ásia, África, Oriente Médio e América Latina.
Ainda que o mercado local siga combalido, desde o ano passado a Scania faz investimento suntuoso de R$ 2,6 bilhões na operação brasileira. O aporte, que só será concluído em 2020, vai atender a necessidade de desenvolver novos produtos, oferecer treinamento e melhorias à rede de concessionárias e modernizar a fábrica do ABC paulista seguindo conceitos de Indústria 4.0.