Ao sancionar a Lei 13.154/2015 no final de julho, a presidente Dilma Rousseff pôs fim a uma discussão sobre os ciclomotores que já durava quase 20 anos. A nova lei altera a anterior, de 1997, que transferia aos municípios a função de regulamentar o uso dos ciclomotores, e os equiparava aos veículos de tração humana e animal, como as bicicletas e carroças. Desde 1º de agosto deste ano, cabe ao Departamento de Trânsito (Detran) de cada Estado providenciar o registro e o licenciamento desses veículos.
Os ciclomotores possuem motor de até 50 cm³ e velocidade máxima de 50 km/h. São simples, econômicos e têm baixo valor de aquisição, e ainda gozavam de uma liberdade sem igual. Por omissão, ou falta de condições, grande parte dos municípios brasileiros não criavam leis para regulamentar sua posse e uso. Sem legislação, não havia como fiscalizar e os agentes públicos não poderiam autuar o piloto ou apreender o veículo.
Em pouco tempo a fama de “não precisar emplacar” tornou-se um forte argumento de vendas e veio o sucesso. Dezenas de importadores independentes trouxeram ciclomotores ao Brasil e criaram uma forte demanda. Segundo a Abraciclo, associação dos fabricantes do setor, entre 2010 e 2014 foram importadas mais de 650 mil unidades e a produção interna foi de 195 mil ciclomotores. Desse total, menos de 10% foram emplacados, segundo dados do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito). Com a nova lei, mais de 750 mil ciclomotores entraram na clandestinidade.
Para ficar na lei
A partir da nova lei, o comprador deverá apresentar os documentos pessoais e um comprovante de residência. Assim será expedido o Renavam (Registro Nacional de Veículos Automotores) que passará a ter as mesmas condições das motos e scooters. “Quem comprou ciclomotor de importadores que não estão mais estabelecidos nos País terão problemas para emplacá-los”, afirma Airton Pinto da Silva, gerente comercial da Traxx. Segundo ele, é necessário que a empresa tenha efetuado o registro do ciclomotor no BIN (Base de Índice Nacional), banco de dados oficiais do Denatran.
Além do emplacamento, o ciclomotor só poderá ser conduzido por piloto maior de 18 anos que possuir carteira de habilitação (categoria “A”) ou Autorização para Conduzir Ciclomotor (ACC). O documento tem o mesmo custo e exige que o piloto faça os cursos práticos e teóricos como se fosse tirar a CNH, porém o exame final é feito com um ciclomotor. Ou seja, na prática a ACC deixa de fazer sentido.
Com a nova Lei caberá ao Detran de cada Estado iniciar a fiscalização e divulgar os prazos para a regularização do veículo. Em Pernambuco, um dos principais mercados consumidores de ciclomotor, o prazo é de 90 dias, mas poderá ser alterado de acordo com os estudos feitos pelo órgão.
A nova lei é vista de forma positiva pela Abraciclo, segundo José Eduardo Gonçalves, diretor executivo da entidade, “assim como todos os veículos motorizados, os ciclomotores também necessitam de controle e fiscalização. Tudo em prol da segurança do piloto e demais usuários das vias”, afirma o executivo.
Fim do sucesso?
A Shineray é um dos maiores importadores desse tipo de veículo e oferece mais de 11 modelos em seu line-up. A marca possui 235 concessionárias e inaugurou recentemente uma fábrica no complexo de Suape, em Pernambuco, com a capacidade de produzir 250 mil unidades por ano. Em nota a empresa afirmou não acreditar que o mercado será abalado pela mudança na legislação.
É a mesma opinião de Airton da Silva, da Traxx: “tudo será uma questão de tempo”. Em praças onde os vendedores usaram como argumento a ausência de emplacamento e que o ciclomotor podia ser pilotado por menores ou sem habilitação, será preciso mais tempo para o consumidor assimilar a nova cultura do emplacamento. Airton ainda afirma que tais veículos são a solução para os problemas de mobilidade. “Basta lembrar que no Ceará existem 265 municípios e pouco mais de 20 têm transporte urbano”, lembra.
Estados como Minas Gerais, Bahia e Pernambuco são os principais consumidores deste tipo de veículo. E eles terão pela frente o grande desafio de registrar e emplacar milhares de ciclomotores que, até 31 de julho, eram equiparados às carroças. Na maioria das cidades brasileiras rodavam pelas ruas e estradas sem fiscalização, às margens da lei.