O cenário não é nada animador para o mercado de veículos importados: as vendas de 2015 devem ficar pelo menos 10% abaixo do resultado do ano passado, quando o segmento já havia registrado queda de 14,3% na comparação com o ano anterior (leia aqui). A projeção é da Abeifa, associação que reúne importadoras e fabricantes, que preveem volume próximo a 84,3 mil unidades, mantendo a participação de 3% no mercado total de veículos no Brasil.
Para Marcel Visconde, presidente da Abeifa, a previsão considera a conjuntura econômica atual, o que segundo ele, resultou no fraco desempenho durante o primeiro bimestre, quando as 28 associadas emplacaram 13,2 mil veículos, entre automóveis e comerciais leves, queda de 27,1% contra igual período do ano passado, quando o segmento licenciou 18,1 mil unidades. Para ele, o resultado de janeiro, cuja queda foi de 22,2% (leia aqui) já sinalizava “que a luz vermelha estava acesa”, enquanto que a forte retração verificada em fevereiro, de 32,5% sobre igual mês do ano passado, confirma que este será um primeiro semestre bastante difícil.
“Tínhamos expectativa de aumento do câmbio para 2015, mas não contávamos que seria de forma tão antecipada e com essa intensidade, com uma desvalorização de 20% em três semanas. Além disso, a baixa confiança do consumidor é o que realmente afeta o mercado, não só o de veículos produzidos aqui, mas também o do importado: não por falta de renda, mas pelas incertezas: assim como o consumidor do carro popular adia a compra por não saber se daqui a um ano estará empregado, por exemplo, o cliente do carro importado talvez tenha que tomar decisões também no seu âmbito profissional que não permita o consumo imediato, então há o adiamento desta ou daquela compra”, explica Visconde durante a apresentação dos resultados na terça-feira, 10, em São Paulo.
O executivo aponta outros elementos que continuarão a influenciar o desempenho nos próximos meses, como os índices de previsão de PIB “sofrível”, alta dos juros e aumento da inflação: “A crise está aí: no ano passado, tivemos alguns elementos como Copa e eleições que influenciaram os mercados, mas agora não há motivos circunstanciais. A inflação deve passar do teto da meta, para algo como 7,5%, podendo chegar a 8%. O câmbio volátil traz a alta do dólar, o que causa ‘sangramento’ para os importadores. Com baixa autoestima, baixa confiança e baixo consumo, não vamos passar incólumes, vai arranhar sim”.
Ele afirma que quase não houve repasse da alta de preços para o consumidor, uma vez que as redes ainda trabalham com estoques remanescentes de 2014. “O repasse vai depender muito de cada empresa. Algumas fábricas ajudam neste contexto de dólar galopante, na hora de recompor o mix de estoques.” Acrescenta que a crise chegou no mercado premium, considerando veículos com valores acima de R$ 100 mil: “No ano passado, não havia dificuldades nesta faixa [de preço], neste ano já registramos retração de 15%. Se o mercado de importados tivesse demanda, o câmbio seria secundário, mas a flutuação da taxa é o pior indicador: com demanda baixa e dólar subindo, US$ 5 mil ou US$ 10 mil fazem sim diferença”.
Por sua vez, Sérgio Habib, presidente da JAC Motors e membro da diretoria da Abeifa, afirmou que as vendas no mercado total de veículos no Brasil – considerando os produzidos localmente, os importados pelas associadas à Anfavea e os importados da Abeifa – deve cair algo em torno de 12% a 14% em 2015.
Em sua análise, Habib disse que março, mês que será um dos mais longos do ano em termos de dias úteis, começou com queda maior que 20% nas vendas: “A média diária por dia útil neste mês está em 9,2 mil unidades – no ano passado, era de 12 mil. Deve recuperar algum fôlego mais para o fim do mês, o que deve fechar em algo como 230 mil unidades, igual a março de 2014, quando tivemos carnaval. Em suma, neste primeiro trimestre o mercado total vai cair até 18%”, cravou. Ele acrescentou: “No ano passado, o mercado só piorou depois do primeiro trimestre, que foi relativamente bom”.
Efeito colateral
Para o presidente da Abeifa, os resultados já consolidados do primeiro bimestre e a perspectiva negativa para o ano levarão as marcas importadoras a readequar seu modelo de negócio e afirma que cada empresa avaliará a situação de forma independente: “Via de regra, o setor de importados deve ‘emagrecer’, com readequação, redução de estrutura e quadro de revendas”, disse, sem descartar a possibilidade de demissões nas redes.
Ele reforça que diante do cenário atual “não existem indicadores que vislumbrem otimismo”, mas defende a adoção de medidas menos pontuais: “O governo precisa se comunicar melhor. Se tiver que fazer algo, faça rápido e em dose única. Isso dará uma perspectiva de que as coisas podem melhorar. Se ficar nessa inércia política, as coisas tendem a piorar”, disse.
Sua crítica sobre o câmbio flutuante também esbarra na política econômica: “O governo não sinaliza qual a margem confortável, isso deixa livre para a volatilidade”, resume.
Por outro lado, a Abeifa deve retomar o contato com o governo, a partir da primeira reunião com o novo ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Armando Monteiro, agendada para o início de abril. “A pauta será sobre conjuntura: a falta de importação, colocar nossas questões e pleitos e analisar juntos sobre a sua percepção de Inovar-Auto”, concluiu.