A engenharia da Ford mudou tudo no Troller T4, não sobrou um parafuso sequer do modelo antigo, que começou a ser fabricado em Horizonte (CE) no início dos anos 2000 – antes, portanto, de a Ford comprar a operação, em 2007. Na sua primeira grande remodelação, o design foi refeito e o jipinho ganhou novos chassis, motor, câmbio e cabine, com dimensões um pouco mais amplas e maior conforto que a anterior. Mas a modernidade cobra preço alto no caso do T4, que saltou de já salgados R$ 96.844 para R$ 110.990, em versão única de acabamento, conforme já havia sido antecipado pela própria Ford.
Apesar do crescimento de R$ 14 mil no preço, a expectativa da Troller é de dobrar as vendas para cerca de 3 mil unidades/ano nas 20 concessionárias da marca, que começam a receber o novo T4 em agosto. A aposta é que o cliente é um perdulário atávico fanático por esse tipo de carro, que pode ter o jipinho como um terceiro carro. Pesquisas internas da marca demonstram que 48% dos compradores atualmente já têm ou tiveram um Troller e, em média, ainda gastam 15% do valor de compra para equipar o veículo com itens como quebra-mato, guincho elétrico, pneus de lama etc. Justamente por isso já foi criado com o novo T4 um pacote de acessórios homologados, que não afetam a garantia de três anos. No total, o comprador pode gastar o total ao redor de R$ 12 mil extras com esses equipamentos, ou R$ 17 mil se for incluído o guincho.
“Quanto mais de nicho for o carro, menos ele é afetado pela variação de preço”, confia Wilson Vasconcellos Filho, gerente de vendas, marketing e serviços da Troller. “O que precisamos vender ao cliente é que o T4 não ficou assim tão mais caro quando se mostra toda a evolução dele. O design é outro, a cabine está mais confortável, ganhou ar-condicionado dual zone, tem rodas de 17 polegadas e é um carro diesel com motor de 200 cavalos”, argumenta. O executivo também lembra que não há concorrentes para o Troller no mercado brasileiro. “O segmento é nosso, não temos competidor direto porque nosso produto é muito mais off-road”, afirma.
Carro novo, hábito velho
O T4 cresceu por todos os lados, no comprimento, largura, altura e entre-eixos. Por dentro continua sem grandes luxos, mas ficou mais habitável com bancos de couro sintético e novo painel. Ele também ganhou ar-condicionado eletrônico dual zone, sistema de som e visor de instrumentos comunizados da picape Ford Ranger, assim como volante e alavancas de seta e limpador de vidros – uma maneira de contornar a baixa escala de produção para alguns componentes.
Embaixo do capô agora está também o mesmo motor da Ranger, feito na Ford Argentina, um potente turbodiesel 3.2 de 200 cavalos e torque de 400 Nm – que substitui o MWM 3.2 de 165 cv. O câmbio manual também é o mesmo de seis marchas da Ranger, feito pela Getrag Jiangxi Transmission, da China, empresa de transmissões de origem alemã controlada pela Ford. Existem três opções de tração, comutadas eletronicamente por um botão no console: 4x2 traseira, 4x4 normal e 4x4 reduzida (esta para terrenos muito irregulares ou submersos na água).
Na prática, o Troller subiu de nível, mas o anterior era tão baixo que essa evolução, embora notável, não chega a transformar o T4 em um carro urbano de luxo, como sugere seu preço. Para rodar no asfalto, ele está mais confortável, mas não deixou de ser desconfortável, com direção imprecisa (devido ao eixo rígido na suspensão dianteira, própria para o off-road), assento pouco ergonômico, posição de dirigir apertada, alto ruído interno (que já foi bem maior no modelo antigo), acabamentos toscos e câmbio ríspido.
Fica em questão também a segurança de um carro com cabine de fibra de vidro com estrutura tubular, que sequer tem airbags frontais (a legislação permite isso para modelos off-road) ou cintos com pré-tencionador. Equipado com motor de 200 cavalos que leva o carro facilmente a 160 km/h (velocidade limitada eletronicamente), tudo pode ficar mais perigoso.
Fora da estrada, contudo, o Troller T4 reina absoluto. É inegável sua capacidade de escalar rampas de 45 graus, atravessar atoleiros instransponíveis e passar por rios com água batendo no retrovisor externo. Por isso o piso da cabine é todo emborrachado e lavável, assim como existe espaço no painel para afixar instrumentos de navegação off-road. Na dianteira, pode-se instalar para-choque de aço, ou retirar as ponteiras plásticas para aumentar o ângulo de ataque. Ali também existe espaço para instalação de guincho elétrico de 8 mil libras. O carro sai calçado de fábrica com pneus 255 Pirelli Scorpion, mas o cliente pode optar pelos lameiros homologados pela Troller BF Goodrich Mud ou All-Terrain.
“O T4 é sinônimo de off-road e mexer em um produto que gera paixão em seus clientes é sempre muito complicado. O desenho precisava continuar a passar a imagem bruta de um fora-de-estrada, não podia perder essa conexão com a Troller”, diz João Marcos Ramos, diretor do centro de design da Ford América do Sul, onde o novo T4 foi redesenhado. “É um carro que não pode entregar só beleza, mas precisa também mostrar seus atributos”, explica. Ou seja, o carro é completamente novo, mas manteve seus velhos hábitos rústicos intocados.